Continuação do artigo: A independência da Líbia e o período monárquico
Atrelado as potencias ocidentais o governo de Idris, adota uma postura passiva diante dos conflitos entre os países árabes e Israel, tal comportamento provocou insatisfação, e uma onda de manifestações tomou corpo no país norte africano, o clamor dos manifestantes obrigou o governo a se posicionar favoravelmente ao boicote do petróleo arquitetado pelos países árabes.
Os protestos demonstraram o avanço do nacionalismo árabe na Líbia, principalmente nos meios intelectuais e burgueses, entretanto não havia no país, uma sociedade civil organizada ou movimentos políticos capazes de galvanizar as insatisfação popular com o projeto de subordinação aos interesses das grandes potencias do regime de Idris, porém o comportamento do governo criou insatisfações no exercito que naquele momento começava a sofrer grande influencia dos ideais pan-arabistas.
A insatisfação se tornou concreta, e um grupo de militares radicalizados, comandados pelo capitão Muammar Kadhafi – na época com 27 anos – aproveitando-se de uma viagem internacional do rei Idris, tomou o poder, em setembro de 1969 sem que ao menos houvesse derramamento de uma gota de sangue, a partir desse momento, sob inspiração do nacionalismo árabe, do socialismo árabe e do Islã surge a Jamairia Árabe Popular Socialista da Líbia.
Os militares revolucionários implementaram um amplo programa de nacionalização de empresas, bancos e das riquezas naturais – petróleo – do país, permitindo que a Líbia se livrasse do jugo e da espoliação promovida pelas potencias ocidentais. A Revolução Líbia foi exitosa no sentido de livrar o país da exploração imperialista e promover certo desenvolvimento socioeconômico, hoje a Líbia é o país africano com melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), à frente de todos os países dos BRICS, o que não é pouco em se tratando de um país que se livrou do neocolonialismo europeu.
A Terceira Teoria Universal
Kadafi, enfatizava que a Líbia deveria passar por uma transformação sociocultural, e para sistematizar seu pensamento elaborou a Terceira Teoria Universal (A primeira e a segunda, são o capitalismo liberal e o socialismo cientifico). Em seu Livro Verde (1976), expõe os princípios que norteiam a revolução cultural líbia, indicando que só uma terceira via seria capaz de levar a justiça e a democracia verdadeira aos povos, denunciando deste modo a corrupção das “maquinas de governar” do sistema capitalista e do socialismo marxista, resumindo o sentido de sua “revolução cultural”, afirma:
“Este LIVRO VERDE apresenta solução teórica definitiva do problema da “máquina de governar”…Nos nossos dias, os regimes políticos, no seu todo, são o resultado da luta travada por essas “máquinas” para alcançar o poder — quer essa luta seja pacífica, quer seja armada, como a luta de classes, de seitas, de tribos ou de partidos ou de indivíduos, ela salda-se sempre pelo sucesso de uma “máquina”, indivíduo, grupo, partido ou classe, e pela derrota do povo, logo, pela derrota da verdadeira democracia.”
Para Kadafi a democracia participativa é uma fraude, já que falsificaria o verdadeiro significado da palavra democracia, “o poder do povo”, o parlamentar e seu partido politico, não passariam de um usurpador do poder popular:
“Quando a assembleia parlamentar é formada, na sequência de um partido nas eleições, ela é a assembleia do partido e não a assembleia do povo – ela representa um partido e não o povo – e o poder executivo detido pela assembleia parlamentar é o poder do partido vencedor e não o poder do povo”.
O governante líbio, não aceita a existência de partidos, se refere a eles como forças que servem de instrumento à perpetuação das ditaduras modernas, tanto no sistema capitalista, como no socialismo. Aponta que a luta entre partidos adversários são como as lutas entre tribos e seitas (ao se referir a luta de classes, usa o mesmo argumento), e que estes invariavelmente estão fadados a se corromperem. A luta de um partido é chegar ao poder e na opinião de Kadafi não é justo que um só partido governe uma nação:
“objetivo de um partido é o de alcançar o poder em nome da execução do seu próprio programa. Não é democraticamente admissível que um partido governe um povo inteiro, porque este é constituído por interesses, opiniões, temperamentos, ideologias ou origens diferentes”
Interessante notar como já apontei em artigo anterior a repulsa do socialismo árabe aos conceitos centrais do socialismo cientifico, mesmo respeitando as especificidades socioeconômicas e culturais dos países da região, não se pode deixar de destacar a aversão ao conjunto de paradigmas que sistematizam o pensamento marxista, tanto na versão do socialismo árabe de Michel Aflaq e seu Partido Baath, como na versão kadafista:
“Todas as sociedades onde as classes se combatem entre si foram, antes disso, sociedades de classe única. Mas essa mesma classe engendrou outras classes, em consequência da evolução inevitável das coisa… Enfim: as tentativas de uniformização da base material da sociedade, com o objetivo de resolver o problema do poder, ou de por fim à luta em proveito de um partido, de uma classe, de uma seita ou de uma tribo, têm falhado do mesmo modo que as tentativas de satisfazer as mesmas pela eleição de representantes, ou pela organização de referendos; continuar nessa via seria perder tempo e ridicularizar o povo”.
A solução para as imposturas do capitalismo liberal e do marxismo seria a realização da democracia direta, deste modo o único meio de se atingir a democracia popular seria por meios dos congressos e comitês populares, já que seria impossível reunir toda população de um Estado-Nação em um só local, através da Terceira Teoria Universal e de forma messiânica, Kadafi anuncia a solução para o problema da democracia: “O poder do povo só tem uma face e só se pode realizar o poder democrático de uma maneira: pelos congressos populares e comitês populares. Não há democracia sem congressos populares” e “comitês populares por toda a parte”.
A ideia é bem simples, o povo se dividiria em congressos de bases, por sua vez os congressos escolheriam um comitê, que formariam congressos populares, o conjunto dos congressos populares formariam comitês administrativos substituiriam o poder centralizado e passariam a gerir os serviços públicos. A cada ano se reuniria o Congresso Geral do Povo, que discutiria os problemas levantados nos diversos congressos e comitês, nas palavras de Kadafi: O poder do povo só tem uma face e só se pode realizar o poder democrático de uma maneira: pelos congressos populares e comitês populares. “Não há democracia sem congressos populares” e “comitês populares por toda a parte”.
É evidente que esse modelo é um meio de democracia representativa sem partidos políticos, no entanto, na prática Kadafi sempre exerceu o poder – em aliança com os diversos chefes tribais – com mão de ferro e sempre procurou alijar possíveis opositores de mecanismos de ausculta popular, se perpetuando no poder por mais de 40 anos. Os avanços econômicos garantiram a popularidade de Kadafi e poucos desafiaram seu regime, a conjuntura começou a mudar a partir da década de 2000 quando se adota medidas liberalizantes, que gera desemprego e por consequência, insatisfação popular. Mas isso é assunto para um próximo artigo.
Marcio Moraes do Nascimento
*Continuação do artigo
Atrelado as potencias ocidentais o governo de Idris, adota uma postura passiva diante dos conflitos entre os países árabes e Israel, tal comportamento provocou insatisfação, e uma onda de manifestações tomou corpo no país norte africano, o clamor dos manifestantes obrigou o governo a se posicionar favoravelmente ao boicote do petróleo arquitetado pelos países árabes.
Os protestos demonstraram o avanço do nacionalismo árabe na Líbia, principalmente nos meios intelectuais e burgueses, entretanto não havia no país, uma sociedade civil organizada ou movimentos políticos capazes de galvanizar as insatisfação popular com o projeto de subordinação aos interesses das grandes potencias do regime de Idris, porém o comportamento do governo criou insatisfações no exercito que naquele momento começava a sofrer grande influencia dos ideais pan-arabistas.
A insatisfação se tornou concreta, e um grupo de militares radicalizados, comandados pelo capitão Muammar Kadhafi – na época com 27 anos – aproveitando-se de uma viagem internacional do rei Idris, tomou o poder, em setembro de 1969 sem que ao menos houvesse derramamento de uma gota de sangue, a partir desse momento, sob inspiração do nacionalismo árabe, do socialismo árabe e do Islã surge a Jamairia Árabe Popular Socialista da Líbia.
Os militares revolucionários implementaram um amplo programa de nacionalização de empresas, bancos e das riquezas naturais – petróleo – do país, permitindo que a Líbia se livrasse do jugo e da espoliação promovida pelas potencias ocidentais. A Revolução Líbia foi exitosa no sentido de livrar o país da exploração imperialista e promover certo desenvolvimento socioeconômico, hoje a Líbia é o país africano com melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), à frente de todos os países dos BRICS, o que não é pouco em se tratando de um país que se livrou do neocolonialismo europeu.
A Terceira Teoria Universal
Kadafi, enfatizava que a Líbia deveria passar por uma transformação sociocultural, e para sistematizar seu pensamento elaborou a Terceira Teoria Universal (A primeira e a segunda, são o capitalismo liberal e o socialismo cientifico). Em seu Livro Verde (1976), expõe os princípios que norteiam a revolução cultural líbia, indicando que só uma terceira via seria capaz de levar a justiça e a democracia verdadeira aos povos, denunciando deste modo a corrupção das “maquinas de governar” do sistema capitalista e do socialismo marxista, resumindo o sentido de sua “revolução cultural”, afirma:
“Este LIVRO VERDE apresenta solução teórica definitiva do problema da “máquina de governar”…Nos nossos dias, os regimes políticos, no seu todo, são o resultado da luta travada por essas “máquinas” para alcançar o poder — quer essa luta seja pacífica, quer seja armada, como a luta de classes, de seitas, de tribos ou de partidos ou de indivíduos, ela salda-se sempre pelo sucesso de uma “máquina”, indivíduo, grupo, partido ou classe, e pela derrota do povo, logo, pela derrota da verdadeira democracia.”
Para Kadafi a democracia participativa é uma fraude, já que falsificaria o verdadeiro significado da palavra democracia, “o poder do povo”, o parlamentar e seu partido politico, não passariam de um usurpador do poder popular:
“Quando a assembleia parlamentar é formada, na sequência de um partido nas eleições, ela é a assembleia do partido e não a assembleia do povo – ela representa um partido e não o povo – e o poder executivo detido pela assembleia parlamentar é o poder do partido vencedor e não o poder do povo”.
O governante líbio, não aceita a existência de partidos, se refere a eles como forças que servem de instrumento à perpetuação das ditaduras modernas, tanto no sistema capitalista, como no socialismo. Aponta que a luta entre partidos adversários são como as lutas entre tribos e seitas (ao se referir a luta de classes, usa o mesmo argumento), e que estes invariavelmente estão fadados a se corromperem. A luta de um partido é chegar ao poder e na opinião de Kadafi não é justo que um só partido governe uma nação:
“objetivo de um partido é o de alcançar o poder em nome da execução do seu próprio programa. Não é democraticamente admissível que um partido governe um povo inteiro, porque este é constituído por interesses, opiniões, temperamentos, ideologias ou origens diferentes”
Interessante notar como já apontei em artigo anterior a repulsa do socialismo árabe aos conceitos centrais do socialismo cientifico, mesmo respeitando as especificidades socioeconômicas e culturais dos países da região, não se pode deixar de destacar a aversão ao conjunto de paradigmas que sistematizam o pensamento marxista, tanto na versão do socialismo árabe de Michel Aflaq e seu Partido Baath, como na versão kadafista:
“Todas as sociedades onde as classes se combatem entre si foram, antes disso, sociedades de classe única. Mas essa mesma classe engendrou outras classes, em consequência da evolução inevitável das coisa… Enfim: as tentativas de uniformização da base material da sociedade, com o objetivo de resolver o problema do poder, ou de por fim à luta em proveito de um partido, de uma classe, de uma seita ou de uma tribo, têm falhado do mesmo modo que as tentativas de satisfazer as mesmas pela eleição de representantes, ou pela organização de referendos; continuar nessa via seria perder tempo e ridicularizar o povo”.
A solução para as imposturas do capitalismo liberal e do marxismo seria a realização da democracia direta, deste modo o único meio de se atingir a democracia popular seria por meios dos congressos e comitês populares, já que seria impossível reunir toda população de um Estado-Nação em um só local, através da Terceira Teoria Universal e de forma messiânica, Kadafi anuncia a solução para o problema da democracia: “O poder do povo só tem uma face e só se pode realizar o poder democrático de uma maneira: pelos congressos populares e comitês populares. Não há democracia sem congressos populares” e “comitês populares por toda a parte”.
A ideia é bem simples, o povo se dividiria em congressos de bases, por sua vez os congressos escolheriam um comitê, que formariam congressos populares, o conjunto dos congressos populares formariam comitês administrativos substituiriam o poder centralizado e passariam a gerir os serviços públicos. A cada ano se reuniria o Congresso Geral do Povo, que discutiria os problemas levantados nos diversos congressos e comitês, nas palavras de Kadafi: O poder do povo só tem uma face e só se pode realizar o poder democrático de uma maneira: pelos congressos populares e comitês populares. “Não há democracia sem congressos populares” e “comitês populares por toda a parte”.
É evidente que esse modelo é um meio de democracia representativa sem partidos políticos, no entanto, na prática Kadafi sempre exerceu o poder – em aliança com os diversos chefes tribais – com mão de ferro e sempre procurou alijar possíveis opositores de mecanismos de ausculta popular, se perpetuando no poder por mais de 40 anos. Os avanços econômicos garantiram a popularidade de Kadafi e poucos desafiaram seu regime, a conjuntura começou a mudar a partir da década de 2000 quando se adota medidas liberalizantes, que gera desemprego e por consequência, insatisfação popular. Mas isso é assunto para um próximo artigo.
Continuação do artigo
Atrelado as potencias ocidentais o governo de Idris, adota uma postura passiva diante dos conflitos entre os países árabes e Israel, tal comportamento provocou insatisfação, e uma onda de manifestações tomou corpo no país norte africano, o clamor dos manifestantes obrigou o governo a se posicionar favoravelmente ao boicote do petróleo arquitetado pelos países árabes.
Os protestos demonstraram o avanço do nacionalismo árabe na Líbia, principalmente nos meios intelectuais e burgueses, entretanto não havia no país, uma sociedade civil organizada ou movimentos políticos capazes de galvanizar as insatisfação popular com o projeto de subordinação aos interesses das grandes potencias do regime de Idris, porém o comportamento do governo criou insatisfações no exercito que naquele momento começava a sofrer grande influencia dos ideais pan-arabistas.
A insatisfação se tornou concreta, e um grupo de militares radicalizados, comandados pelo capitão Muammar Kadhafi – na época com 27 anos – aproveitando-se de uma viagem internacional do rei Idris, tomou o poder, em setembro de 1969 sem que ao menos houvesse derramamento de uma gota de sangue, a partir desse momento, sob inspiração do nacionalismo árabe, do socialismo árabe e do Islã surge a Jamairia Árabe Popular Socialista da Líbia.
Os militares revolucionários implementaram um amplo programa de nacionalização de empresas, bancos e das riquezas naturais – petróleo – do país, permitindo que a Líbia se livrasse do jugo e da espoliação promovida pelas potencias ocidentais. A Revolução Líbia foi exitosa no sentido de livrar o país da exploração imperialista e promover certo desenvolvimento socioeconômico, hoje a Líbia é o país africano com melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), à frente de todos os países dos BRICS, o que não é pouco em se tratando de um país que se livrou do neocolonialismo europeu.
A Terceira Teoria Universal
Kadafi, enfatizava que a Líbia deveria passar por uma transformação sociocultural, e para sistematizar seu pensamento elaborou a Terceira Teoria Universal (A primeira e a segunda, são o capitalismo liberal e o socialismo cientifico). Em seu Livro Verde (1976), expõe os princípios que norteiam a revolução cultural líbia, indicando que só uma terceira via seria capaz de levar a justiça e a democracia verdadeira aos povos, denunciando deste modo a corrupção das “maquinas de governar” do sistema capitalista e do socialismo marxista, resumindo o sentido de sua “revolução cultural”, afirma:
“Este LIVRO VERDE apresenta solução teórica definitiva do problema da “máquina de governar”…Nos nossos dias, os regimes políticos, no seu todo, são o resultado da luta travada por essas “máquinas” para alcançar o poder — quer essa luta seja pacífica, quer seja armada, como a luta de classes, de seitas, de tribos ou de partidos ou de indivíduos, ela salda-se sempre pelo sucesso de uma “máquina”, indivíduo, grupo, partido ou classe, e pela derrota do povo, logo, pela derrota da verdadeira democracia.”
Para Kadafi a democracia participativa é uma fraude, já que falsificaria o verdadeiro significado da palavra democracia, “o poder do povo”, o parlamentar e seu partido politico, não passariam de um usurpador do poder popular:
“Quando a assembleia parlamentar é formada, na sequência de um partido nas eleições, ela é a assembleia do partido e não a assembleia do povo – ela representa um partido e não o povo – e o poder executivo detido pela assembleia parlamentar é o poder do partido vencedor e não o poder do povo”.
O governante líbio, não aceita a existência de partidos, se refere a eles como forças que servem de instrumento à perpetuação das ditaduras modernas, tanto no sistema capitalista, como no socialismo. Aponta que a luta entre partidos adversários são como as lutas entre tribos e seitas (ao se referir a luta de classes, usa o mesmo argumento), e que estes invariavelmente estão fadados a se corromperem. A luta de um partido é chegar ao poder e na opinião de Kadafi não é justo que um só partido governe uma nação:
“objetivo de um partido é o de alcançar o poder em nome da execução do seu próprio programa. Não é democraticamente admissível que um partido governe um povo inteiro, porque este é constituído por interesses, opiniões, temperamentos, ideologias ou origens diferentes”
Interessante notar como já apontei em artigo anterior a repulsa do socialismo árabe aos conceitos centrais do socialismo cientifico, mesmo respeitando as especificidades socioeconômicas e culturais dos países da região, não se pode deixar de destacar a aversão ao conjunto de paradigmas que sistematizam o pensamento marxista, tanto na versão do socialismo árabe de Michel Aflaq e seu Partido Baath, como na versão kadafista:
“Todas as sociedades onde as classes se combatem entre si foram, antes disso, sociedades de classe única. Mas essa mesma classe engendrou outras classes, em consequência da evolução inevitável das coisa… Enfim: as tentativas de uniformização da base material da sociedade, com o objetivo de resolver o problema do poder, ou de por fim à luta em proveito de um partido, de uma classe, de uma seita ou de uma tribo, têm falhado do mesmo modo que as tentativas de satisfazer as mesmas pela eleição de representantes, ou pela organização de referendos; continuar nessa via seria perder tempo e ridicularizar o povo”.
A solução para as imposturas do capitalismo liberal e do marxismo seria a realização da democracia direta, deste modo o único meio de se atingir a democracia popular seria por meios dos congressos e comitês populares, já que seria impossível reunir toda população de um Estado-Nação em um só local, através da Terceira Teoria Universal e de forma messiânica, Kadafi anuncia a solução para o problema da democracia: “O poder do povo só tem uma face e só se pode realizar o poder democrático de uma maneira: pelos congressos populares e comitês populares. Não há democracia sem congressos populares” e “comitês populares por toda a parte”.
A ideia é bem simples, o povo se dividiria em congressos de bases, por sua vez os congressos escolheriam um comitê, que formariam congressos populares, o conjunto dos congressos populares formariam comitês administrativos substituiriam o poder centralizado e passariam a gerir os serviços públicos. A cada ano se reuniria o Congresso Geral do Povo, que discutiria os problemas levantados nos diversos congressos e comitês, nas palavras de Kadafi: O poder do povo só tem uma face e só se pode realizar o poder democrático de uma maneira: pelos congressos populares e comitês populares. “Não há democracia sem congressos populares” e “comitês populares por toda a parte”.
É evidente que esse modelo é um meio de democracia representativa sem partidos políticos, no entanto, na prática Kadafi sempre exerceu o poder – em aliança com os diversos chefes tribais – com mão de ferro e sempre procurou alijar possíveis opositores de mecanismos de ausculta popular, se perpetuando no poder por mais de 40 anos. Os avanços econômicos garantiram a popularidade de Kadafi e poucos desafiaram seu regime, a conjuntura começou a mudar a partir da década de 2000 quando se adota medidas liberalizantes, que gera desemprego e por consequência, insatisfação popular. Mas isso é assunto para um próximo artigo.
Continuação do artigo
Atrelado as potencias ocidentais o governo de Idris, adota uma postura passiva diante dos conflitos entre os países árabes e Israel, tal comportamento provocou insatisfação, e uma onda de manifestações tomou corpo no país norte africano, o clamor dos manifestantes obrigou o governo a se posicionar favoravelmente ao boicote do petróleo arquitetado pelos países árabes.
Os protestos demonstraram o avanço do nacionalismo árabe na Líbia, principalmente nos meios intelectuais e burgueses, entretanto não havia no país, uma sociedade civil organizada ou movimentos políticos capazes de galvanizar as insatisfação popular com o projeto de subordinação aos interesses das grandes potencias do regime de Idris, porém o comportamento do governo criou insatisfações no exercito que naquele momento começava a sofrer grande influencia dos ideais pan-arabistas.
A insatisfação se tornou concreta, e um grupo de militares radicalizados, comandados pelo capitão Muammar Kadhafi – na época com 27 anos – aproveitando-se de uma viagem internacional do rei Idris, tomou o poder, em setembro de 1969 sem que ao menos houvesse derramamento de uma gota de sangue, a partir desse momento, sob inspiração do nacionalismo árabe, do socialismo árabe e do Islã surge a Jamairia Árabe Popular Socialista da Líbia.
Os militares revolucionários implementaram um amplo programa de nacionalização de empresas, bancos e das riquezas naturais – petróleo – do país, permitindo que a Líbia se livrasse do jugo e da espoliação promovida pelas potencias ocidentais. A Revolução Líbia foi exitosa no sentido de livrar o país da exploração imperialista e promover certo desenvolvimento socioeconômico, hoje a Líbia é o país africano com melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), à frente de todos os países dos BRICS, o que não é pouco em se tratando de um país que se livrou do neocolonialismo europeu.
A Terceira Teoria Universal
Kadafi, enfatizava que a Líbia deveria passar por uma transformação sociocultural, e para sistematizar seu pensamento elaborou a Terceira Teoria Universal (A primeira e a segunda, são o capitalismo liberal e o socialismo cientifico). Em seu Livro Verde (1976), expõe os princípios que norteiam a revolução cultural líbia, indicando que só uma terceira via seria capaz de levar a justiça e a democracia verdadeira aos povos, denunciando deste modo a corrupção das “maquinas de governar” do sistema capitalista e do socialismo marxista, resumindo o sentido de sua “revolução cultural”, afirma:
“Este LIVRO VERDE apresenta solução teórica definitiva do problema da “máquina de governar”…Nos nossos dias, os regimes políticos, no seu todo, são o resultado da luta travada por essas “máquinas” para alcançar o poder — quer essa luta seja pacífica, quer seja armada, como a luta de classes, de seitas, de tribos ou de partidos ou de indivíduos, ela salda-se sempre pelo sucesso de uma “máquina”, indivíduo, grupo, partido ou classe, e pela derrota do povo, logo, pela derrota da verdadeira democracia.”
Para Kadafi a democracia participativa é uma fraude, já que falsificaria o verdadeiro significado da palavra democracia, “o poder do povo”, o parlamentar e seu partido politico, não passariam de um usurpador do poder popular:
“Quando a assembleia parlamentar é formada, na sequência de um partido nas eleições, ela é a assembleia do partido e não a assembleia do povo – ela representa um partido e não o povo – e o poder executivo detido pela assembleia parlamentar é o poder do partido vencedor e não o poder do povo”.
O governante líbio, não aceita a existência de partidos, se refere a eles como forças que servem de instrumento à perpetuação das ditaduras modernas, tanto no sistema capitalista, como no socialismo. Aponta que a luta entre partidos adversários são como as lutas entre tribos e seitas (ao se referir a luta de classes, usa o mesmo argumento), e que estes invariavelmente estão fadados a se corromperem. A luta de um partido é chegar ao poder e na opinião de Kadafi não é justo que um só partido governe uma nação:
“objetivo de um partido é o de alcançar o poder em nome da execução do seu próprio programa. Não é democraticamente admissível que um partido governe um povo inteiro, porque este é constituído por interesses, opiniões, temperamentos, ideologias ou origens diferentes”
Interessante notar como já apontei em artigo anterior a repulsa do socialismo árabe aos conceitos centrais do socialismo cientifico, mesmo respeitando as especificidades socioeconômicas e culturais dos países da região, não se pode deixar de destacar a aversão ao conjunto de paradigmas que sistematizam o pensamento marxista, tanto na versão do socialismo árabe de Michel Aflaq e seu Partido Baath, como na versão kadafista:
“Todas as sociedades onde as classes se combatem entre si foram, antes disso, sociedades de classe única. Mas essa mesma classe engendrou outras classes, em consequência da evolução inevitável das coisa… Enfim: as tentativas de uniformização da base material da sociedade, com o objetivo de resolver o problema do poder, ou de por fim à luta em proveito de um partido, de uma classe, de uma seita ou de uma tribo, têm falhado do mesmo modo que as tentativas de satisfazer as mesmas pela eleição de representantes, ou pela organização de referendos; continuar nessa via seria perder tempo e ridicularizar o povo”.
A solução para as imposturas do capitalismo liberal e do marxismo seria a realização da democracia direta, deste modo o único meio de se atingir a democracia popular seria por meios dos congressos e comitês populares, já que seria impossível reunir toda população de um Estado-Nação em um só local, através da Terceira Teoria Universal e de forma messiânica, Kadafi anuncia a solução para o problema da democracia: “O poder do povo só tem uma face e só se pode realizar o poder democrático de uma maneira: pelos congressos populares e comitês populares. Não há democracia sem congressos populares” e “comitês populares por toda a parte”.
A ideia é bem simples, o povo se dividiria em congressos de bases, por sua vez os congressos escolheriam um comitê, que formariam congressos populares, o conjunto dos congressos populares formariam comitês administrativos substituiriam o poder centralizado e passariam a gerir os serviços públicos. A cada ano se reuniria o Congresso Geral do Povo, que discutiria os problemas levantados nos diversos congressos e comitês, nas palavras de Kadafi: O poder do povo só tem uma face e só se pode realizar o poder democrático de uma maneira: pelos congressos populares e comitês populares. “Não há democracia sem congressos populares” e “comitês populares por toda a parte”.
É evidente que esse modelo é um meio de democracia representativa sem partidos políticos, no entanto, na prática Kadafi sempre exerceu o poder – em aliança com os diversos chefes tribais – com mão de ferro e sempre procurou alijar possíveis opositores de mecanismos de ausculta popular, se perpetuando no poder por mais de 40 anos. Os avanços econômicos garantiram a popularidade de Kadafi e poucos desafiaram seu regime, a conjuntura começou a mudar a partir da década de 2000 quando se adota medidas liberalizantes, que gera desemprego e por consequência, insatisfação popular. Mas isso é assunto para um próximo artigo.
Continuação do artigo
Atrelado as potencias ocidentais o governo de Idris, adota uma postura passiva diante dos conflitos entre os países árabes e Israel, tal comportamento provocou insatisfação, e uma onda de manifestações tomou corpo no país norte africano, o clamor dos manifestantes obrigou o governo a se posicionar favoravelmente ao boicote do petróleo arquitetado pelos países árabes.
Os protestos demonstraram o avanço do nacionalismo árabe na Líbia, principalmente nos meios intelectuais e burgueses, entretanto não havia no país, uma sociedade civil organizada ou movimentos políticos capazes de galvanizar as insatisfação popular com o projeto de subordinação aos interesses das grandes potencias do regime de Idris, porém o comportamento do governo criou insatisfações no exercito que naquele momento começava a sofrer grande influencia dos ideais pan-arabistas.
A insatisfação se tornou concreta, e um grupo de militares radicalizados, comandados pelo capitão Muammar Kadhafi – na época com 27 anos – aproveitando-se de uma viagem internacional do rei Idris, tomou o poder, em setembro de 1969 sem que ao menos houvesse derramamento de uma gota de sangue, a partir desse momento, sob inspiração do nacionalismo árabe, do socialismo árabe e do Islã surge a Jamairia Árabe Popular Socialista da Líbia.
Os militares revolucionários implementaram um amplo programa de nacionalização de empresas, bancos e das riquezas naturais – petróleo – do país, permitindo que a Líbia se livrasse do jugo e da espoliação promovida pelas potencias ocidentais. A Revolução Líbia foi exitosa no sentido de livrar o país da exploração imperialista e promover certo desenvolvimento socioeconômico, hoje a Líbia é o país africano com melhor Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), à frente de todos os países dos BRICS, o que não é pouco em se tratando de um país que se livrou do neocolonialismo europeu.
A Terceira Teoria Universal
Kadafi, enfatizava que a Líbia deveria passar por uma transformação sociocultural, e para sistematizar seu pensamento elaborou a Terceira Teoria Universal (A primeira e a segunda, são o capitalismo liberal e o socialismo cientifico). Em seu Livro Verde (1976), expõe os princípios que norteiam a revolução cultural líbia, indicando que só uma terceira via seria capaz de levar a justiça e a democracia verdadeira aos povos, denunciando deste modo a corrupção das “maquinas de governar” do sistema capitalista e do socialismo marxista, resumindo o sentido de sua “revolução cultural”, afirma:
“Este LIVRO VERDE apresenta solução teórica definitiva do problema da “máquina de governar”…Nos nossos dias, os regimes políticos, no seu todo, são o resultado da luta travada por essas “máquinas” para alcançar o poder — quer essa luta seja pacífica, quer seja armada, como a luta de classes, de seitas, de tribos ou de partidos ou de indivíduos, ela salda-se sempre pelo sucesso de uma “máquina”, indivíduo, grupo, partido ou classe, e pela derrota do povo, logo, pela derrota da verdadeira democracia.”
Para Kadafi a democracia participativa é uma fraude, já que falsificaria o verdadeiro significado da palavra democracia, “o poder do povo”, o parlamentar e seu partido politico, não passariam de um usurpador do poder popular:
“Quando a assembleia parlamentar é formada, na sequência de um partido nas eleições, ela é a assembleia do partido e não a assembleia do povo – ela representa um partido e não o povo – e o poder executivo detido pela assembleia parlamentar é o poder do partido vencedor e não o poder do povo”.
O governante líbio, não aceita a existência de partidos, se refere a eles como forças que servem de instrumento à perpetuação das ditaduras modernas, tanto no sistema capitalista, como no socialismo. Aponta que a luta entre partidos adversários são como as lutas entre tribos e seitas (ao se referir a luta de classes, usa o mesmo argumento), e que estes invariavelmente estão fadados a se corromperem. A luta de um partido é chegar ao poder e na opinião de Kadafi não é justo que um só partido governe uma nação:
“objetivo de um partido é o de alcançar o poder em nome da execução do seu próprio programa. Não é democraticamente admissível que um partido governe um povo inteiro, porque este é constituído por interesses, opiniões, temperamentos, ideologias ou origens diferentes”
Interessante notar como já apontei em artigo anterior a repulsa do socialismo árabe aos conceitos centrais do socialismo cientifico, mesmo respeitando as especificidades socioeconômicas e culturais dos países da região, não se pode deixar de destacar a aversão ao conjunto de paradigmas que sistematizam o pensamento marxista, tanto na versão do socialismo árabe de Michel Aflaq e seu Partido Baath, como na versão kadafista:
“Todas as sociedades onde as classes se combatem entre si foram, antes disso, sociedades de classe única. Mas essa mesma classe engendrou outras classes, em consequência da evolução inevitável das coisa… Enfim: as tentativas de uniformização da base material da sociedade, com o objetivo de resolver o problema do poder, ou de por fim à luta em proveito de um partido, de uma classe, de uma seita ou de uma tribo, têm falhado do mesmo modo que as tentativas de satisfazer as mesmas pela eleição de representantes, ou pela organização de referendos; continuar nessa via seria perder tempo e ridicularizar o povo”.
A solução para as imposturas do capitalismo liberal e do marxismo seria a realização da democracia direta, deste modo o único meio de se atingir a democracia popular seria por meios dos congressos e comitês populares, já que seria impossível reunir toda população de um Estado-Nação em um só local, através da Terceira Teoria Universal e de forma messiânica, Kadafi anuncia a solução para o problema da democracia: “O poder do povo só tem uma face e só se pode realizar o poder democrático de uma maneira: pelos congressos populares e comitês populares. Não há democracia sem congressos populares” e “comitês populares por toda a parte”.
A ideia é bem simples, o povo se dividiria em congressos de bases, por sua vez os congressos escolheriam um comitê, que formariam congressos populares, o conjunto dos congressos populares formariam comitês administrativos substituiriam o poder centralizado e passariam a gerir os serviços públicos. A cada ano se reuniria o Congresso Geral do Povo, que discutiria os problemas levantados nos diversos congressos e comitês, nas palavras de Kadafi: O poder do povo só tem uma face e só se pode realizar o poder democrático de uma maneira: pelos congressos populares e comitês populares. “Não há democracia sem congressos populares” e “comitês populares por toda a parte”.
É evidente que esse modelo é um meio de democracia representativa sem partidos políticos, no entanto, na prática Kadafi sempre exerceu o poder – em aliança com os diversos chefes tribais – com mão de ferro e sempre procurou alijar possíveis opositores de mecanismos de ausculta popular, se perpetuando no poder por mais de 40 anos. Os avanços econômicos garantiram a popularidade de Kadafi e poucos desafiaram seu regime, a conjuntura começou a mudar a partir da década de 2000 quando se adota medidas liberalizantes, que gera desemprego e por consequência, insatisfação popular. Mas isso é assunto para um próximo artigo.
A obra II – A Revolução Líbia, Kadafi no Poder e sua Terceira Teoria Universal de NASCIMENTO, Marcio Moraes foi licenciada com uma Licença Creative Commons – Atribuição – Uso Não-Comercial – Partilha nos Mesmos Termos 3.0 Não Adaptada.
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